sexta-feira, 26 de abril de 2013

Hugo Chávez (1954-2013): revolucionário ou populista?


Hugo Chávez (1954-2013): revolucionário ou populista?

A morte de Hugo Chávez, polêmico líder venezuelano, desperta sentimentos antagônicos. Seus admiradores e seguidores choram diante das câmeras de televisão que registram a dor da perda e o sentimento de orfandade que lhes aflige. Seus opositores e detratores, por outro lado, não conseguem conter o contentamento que a ausência de Chávez significa para eles, almejando que com sua morte outro cenário político possa surgir na Venezuela.

Sua trajetória política, como tem sido trazido a público pela grande mídia, se inicia com uma tentativa de golpe de estado, no comando de um levante militar ocorrido em 1992, contra o então presidente Andrés Pérez. Foi então preso e condenado, tendo cumprido 2 anos de reclusão para depois, beneficiado por anistia presidencial, retornar ao cenário público venezuelano e ingressar de vez na política de seu país.

Em 1998 se elegeu presidente pela primeira vez, com ampla margem de vantagem sobre os concorrentes. Buscou apoios políticos, queria e se propôs a alterar a constituição, já bradava aos ventos e a todos que se dispusessem a ouvi-lo que iria realizar a revolução bolivariana. Aproximou-se de Cuba e se tornou aliado incondicional de Fidel e Raul Castro. Para os socialistas cubanos esta aproximação foi providencial já que o país estava vivendo dias difíceis após a queda da União Soviética e o cancelamento do envio de verbas para subsidiarem a economia da ilha. O petróleo venezuelano passou a ser fonte para os projetos do novo socialismo venezuelano e, também, para sustentar as ações dos irmãos Castro em Cuba.

Reeleito no ano 2000, Chávez conseguiu maioria na Assembleia e nos Estados, no entanto, sua aparentemente sólida base de apoio ruiu em 2002 quando oficiais do exército, após a eclosão de greves gerais em dezembro de 2001 no país - afetando inclusive a estatal venezuelana que controla o petróleo, maior fonte de riqueza do país - se rebelaram contra o governo chavista e o levaram a exilar-se por 2 dias numa ilha. O que deveria ser seu expurgo do comando político da nação acabou se revelando favorável ao próprio Chávez. O feitiço se virou contra os feiticeiros, pois o presidente voltou ainda mais forte, apoiado pela população mais humilde, respaldando-se em programas sociais que focavam no apoio a estas camadas sociais e permitindo que ele se reelegesse em 2004 com mais de 58% dos votos, índice que seria superado na eleição de 2006, quando Chávez conseguiu mais de 61% do total de votos venezuelanos.

Caracterizado por alguns como populista, se autodenominando herdeiro das tradições de Simon Bolivar, agindo de forma a silenciar partidos opositores e a mídia que se mostrava independente, centralizando o poder, criando bases de apoio juntamente a países latino-americanos que contassem com líderes esquerdistas e caudilhistas como ele (como Evo Morales na Bolívia; Christina Kirchner, na Argentina; Fidel e Raul Castro, em Cuba; e Rafael Correa, do Equador) e com ligações de grande proximidade com os governos brasileiros de Lula e Dilma, elegeu os Estados Unidos como seu grande inimigo, culpando os "ianques" pelos problemas que afligiam seu país. A Venezuela é um país que tem hoje a maior inflação entre seus pares sul-americanos, tem alto grau de desemprego, depende enormemente do petróleo e que, durante o governo de Chávez, viu sua indústria ser desmontada. Além disso, há questionamentos dos opositores quanto à licitude dos pleitos que elegeram Chávez, o que coloca em questão a própria legitimidade política de seus mandatos e em xeque o conceito de democracia no país.

Reelegeu-se em 2012, já acometido pelo câncer que o vitimou no início de março de 2013, indo ainda assim as ruas em campanha até que a vitória estivesse garantida. Depois do triunfo eleitoral voltou a Cuba, onde já estivera em tratamento para novas intervenções cirúrgicas. Seu estado tornava-se mais difícil a cada dia, mas a fé e devoção de seus seguidores não os deixavam crer que mais esta importante e necessária vitória seria conseguida por seu comandante. Durante sua ausência, o vice-presidente eleito, Nicolás Maduro, foi empossado, ainda que isso contrariasse a constituição nacional, que na ausência do eleito, previa novas eleições a serem realizadas num breve prazo.

O anúncio da morte de Chávez, feito nacionalmente por Maduro, foi de lágrimas e, ao mesmo tempo, juramentos de fidelidade aos princípios de Chávez, sempre contando com o respaldo dos militares. As leis venezuelanas estipulam que em caso de morte do presidente eleito sejam convocadas novas eleições, que devem acontecer dentro de 30 dias. Este compromisso foi assumido por membros do governo e da Assembleia venezuelana.

A presidência de Chávez, no entanto, evocou conceitos e personagens que, para uma melhor compreensão e análise de sua história, precisam ser revistos, como por exemplo:
- Revolução: Em seu clássico trabalho "Para a crítica da economia política", de 1859, Karl Marx, define que a revolução é uma resposta ao modelo social consolidado que existe sobre bases em que há disparidades socioeconômicas. As divisões sociais estabelecidas privilegiam determinados grupos, como no capitalismo, em que a burguesia, de acordo com os princípios marxistas, é a detentora dos meios de produção (riquezas como dinheiro, terras, máquinas e outros que funcionam como Capital a alavancar lhes os negócios e aumentar-lhes ainda mais o patrimônio e gerar concentração de renda na mão de poucos em detrimento da massa), em oposição à maioria, formada pelos trabalhadores ou proletariado que vende sua mão de obra em troca de salários. A exaustão do sistema acontece quando o nível de exploração é tão grande que a massa se rebela e "revoluciona" a sociedade, definindo a existência de novos modelos ou modos de produção, como o socialismo, em que os bens pertencem a todos e são geridos por representantes da massa trabalhadora.

- Bolivarismo: O termo deriva do nome do líder Simon Bolivar, um dos artífices, ao lado de San Martin, da independência das colônias espanholas na América do Sul. Nascido em Caracas, atual capital da Venezuela, foi o líder da emancipação dos atuais países sul-americanos: Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia e Equador. Foi formado por tutores, tendo educação que lhe proporcionou a leitura de clássicos gregos e também das obras iluministas. Buscou sempre a unidade latino-americana, tendo organizado o Congresso de Angostura em 1819 e produzido o Manifesto de Cartagena em 1813, ambos elementos que são fundantes dentro de sua política de união de forças entre as nações locais contra o domínio europeu. Buscou apoios externos e sua união com San Martin nas guerras contra a Espanha consolidou a região como área livre. Seu sonho de unidade, no entanto, dissipou-se em virtude das disputas entre os vários grupos que dominavam as regiões onde surgiram os países da América do Sul.

- Socialismo: De acordo com os princípios marxistas, o socialismo seria uma etapa de transição a ser cumprida pelos países que lograssem êxito na luta contra as injustiças do modo de produção capitalista. As lideranças que se estabelecessem teriam que assumir compromissos de maior justiça social, igualdade, melhor distribuição de renda e recursos, reforma agrária e outras ações que caracterizassem o surgimento de uma nova nação, em que os meios de produção não mais pertencessem a particulares, mas a todos, sendo geridos por esta máquina pública formada por elementos oriundos do povo, da massa, da plebe. O socialismo seria transição, pois constituiria uma ponte para o estado ideal pensado e proposto na obra de Karl Marx, o comunismo.

- Populismo: Refere-se a uma forma de atuar politicamente segundo a qual os agentes públicos, em busca de apoio da população, se aproximam da mesma, oferecendo-lhes benefícios, propondo grandes reformas, dispondo-se a atuar como representantes da grande massa e, na prática, agindo de forma a preservar o modelo vigente, sem grandes alterações, aliando-se nos bastidores a grupos dominantes e promovendo apenas mudanças superficiais. Projetos de revolução são engavetados em favor de reformas sociais que não alteram de fato o cotidiano da população, dando aos populares o "pão e circo" que lhes iludem, mas que, de fato, não lhes agrega os benefícios reais que necessita, como educação de qualidade, saúde pública de bom nível, emprego, renda, segurança...

João Luís de Almeida Machado
Doutor em Educação pela PUC-SP
Gerente de Tecnologia Educacional
Sistema de Ensino Poliedro

Nenhum comentário:

Postar um comentário